O ano era 2000, e a virada do milênio trazia consigo uma onda de questionamentos sobre os ícones tradicionais. No universo dos quadrinhos, figuras como Batman e Superman eram taxadas de hipócritas e ultrapassadas, abrindo espaço para uma nova era de heróis complexos e moralmente ambíguos. Essa mudança influenciou a criação de obras como "The Boys", "Supremos" e até mesmo eventos marcantes no cinema, como "Guerra Civil" e a visão de Zack Snyder para os heróis da DC.
Décadas depois, "Superman" (2025), o filme de James Gunn, surge como uma resposta poderosa a essa tendência niilista. O filme demonstra que ainda há espaço para super-heróis genuínos, que inspiram esperança e representam o melhor da humanidade. A nova produção da DC Studios centra sua narrativa no papel do Superman no mundo contemporâneo.
Embora exista a necessidade de estabelecer um universo coeso, Gunn utiliza a fantasia como ferramenta para abordar questões relevantes e próximas da nossa realidade. Em um mundo repleto de meta-humanos, o mais poderoso deles é um imigrante de outro planeta, envolvido em uma complexa crise geopolítica. Uma nação influente, aliada dos Estados Unidos, não hesita em usar seu poderio militar para oprimir um país subdesenvolvido em busca de território e recursos. Essa trama, que ecoa conflitos reais, ressalta a importância de um Superman que represente a justiça e a compaixão, não apenas a força bruta.
Gunn compreende que, para revigorar um símbolo como o Superman, é preciso priorizar o sentimento e a emoção. O filme não se prende a explicações detalhadas ou soluções mirabolantes. As respostas são simples e diretas, pois o foco principal é mostrar o bem como uma força contagiante, capaz de despertar o lado humano em cada indivíduo.
É quando se distancia dos clichês do cinema de super-heróis que "Superman" (2025) atinge seu potencial máximo. Gunn, em parceria com o diretor de fotografia Henry Braham, explora lentes e movimentos de câmera, criando um visual divertido e dinâmico, que remete aos desenhos animados clássicos. A fotografia é vibrante e nada convencional, e a fantasia é elevada ao extremo, característica marcante do estilo de James Gunn. Essa estética peculiar, combinada com a nostalgia de uma animação como "Liga da Justiça: Sem Limites", proporciona uma sensação de aventura revigorante.
Apesar de suas qualidades, "Superman" (2025) sofreu com a pressão de ser um filme que precisa gerar resultados financeiros positivos. Por isso, Gunn teve que ceder a algumas convenções do gênero, como a estrutura narrativa dividida em capítulos, que foi abandonada no terço final do filme. A montagem, especialmente na primeira metade, pode parecer um pouco truncada.
No entanto, a autenticidade presente no filme compensa essas pequenas falhas. E essa autenticidade se reflete não apenas no tom e no estilo, mas também no elenco. David Corenswet, Rachel Brosnahan e Nicholas Hoult entregam performances poderosas e naturais. O trio se adapta perfeitamente ao tom caótico de Gunn, tornando até mesmo os diálogos mais simples e diretos, típicos das histórias em quadrinhos do Superman, em conversas cotidianas e convincentes.
O filme prioriza o íntimo e o pessoal em vez da grandiosidade. Mesmo com a vasta construção de mundo e a introdução de diversos personagens, todos têm um propósito na trama. O roteiro confia na inteligência do público para conectar os pontos, uma atitude corajosa em uma época em que os estúdios costumam entregar tudo mastigado.
Em resumo, "Superman" (2025) é um filme de super-heróis autêntico e sincero. Uma obra que se afasta do perfeccionismo e se contenta em ser um reflexo dos valores e do poder de influência do Homem de Aço como um agente do bem a serviço da humanidade. Um filme divertido e bem-feito, que mostra que James Gunn ainda se diverte muito com o que faz.